Recusara a bela jovem a flor oferecida pelo anjo amigo….
Desconsolado, por não compreender tal gesto, o anjo partiu. Partiu para a terra dos anjos, cabisbaixo e solitário… em busca do entendimento sobre aquilo que deveras o abatia. Que sorte o anjo não teve?!
Assim, o anjo em suas cogitações resmungava:
− Por que não posso ter-te por toda a minha vida? Rejeitara a mimosa flor cultivada nos campos do meu coração… o que faço eu então, com esse jardim infinitamente repleto de flores… dos mais diversos matizes, cultivadas pelas mais doces aspirações?
Como seremos, destarte, agora… doravante? Como a lua e o sol, sempre distantes?!
Tornar-te para mim uma miragem, lá longe… no infindo horizonte! Eu, o viajante a contemplar-te, a buscar-te… a definhar-me!
Exausto, a procurar as respostas para suas indagações, no sono caiu… e por dias a fio assim foi.
Talvez devido a um compadecimento Providencial. Uma interferência de Deus era preciso… o anjo, embora imortal, não aguentaria… viraria um “não-sei-o-quê”, perdido a deriva nas estrelas; um espectro a vagar, esquecido por si mesmo, aprofundando-se paulatinamente na imensidão do vácuo existencial… não obstante, ao penetrar à noite dos tempos, esquecer-se-ia de si mesmo e embora ainda incompetente para a morte, morreria… pois a vida é o que se vive. Quantos mortos ainda em vida perambulam por ai… sem objetivo, sem sonhos… sem amores.
Ao acordar lembrara-se de um sonho, depois do qual lamentara:
− Hoje mais uma vez
viestes em meus sonhos
E teus olhos como outrora,
tão belos,
tornaram a enganar-me…
encantei-me novamente!
Vieste tu, terna e adorável
e tirou-me do torpor da saudade…
Teu néctar sorvi, delirante e apaixonado…
− Quão doces emoções senti!
Enternecida e suave minha alma ficou
e ao acordar
ébrio e só,
chorei!
Enquanto o anjo sofria, remoendo cada momento vivido ou que desejara ter acontecido, a jovem rezava para o anjo amigo, e dizia:
− Seja sempre comigo, divino amigo, para que não me percas pelas trevas do caminho… a cada momento eu sinto que tu és o destino a mim oferecido… a fonte de paz e a ditosa sorte da minha jornada, pois o teu amor é a luz que ilumina a minha vida.
Num súbito espanto o Anjo amigo tornou das profundezas do seu interior, mas um tanto confuso… não compreendia agora a rogação que seu divino amor lhe rendia. Todavia, sem titubear, da estrela brilhante, morada dos anjos, desceu o anjo feliz, num estado de espírito excitante, a fim dos pedidos da sua amada, realizar.
− Por onde andaras, querido amigo… por que razão ausentar-te? Perguntou a jovem, aflita ao perceber em seu anjo amigo marcas do flagelo por ele sofrido.
− Tu és meu divino amor, porém rejeitara minha flor que com muito amor cultivei.. Sem horizontes assim fiquei.
−Em busca de algum consolo, debalde, parti. Mas eis que te ouvi, e, para ti, torno, a fim de te servir!
Em tom resignado o anjo curvou-se diante de sua aspiração, para ouvir-lhe a seguinte explicação:
− Foi-te para longe… para bem distante. Não me dera a chance de dizer-te o quanto para mim tu te tornara importante. Quando dei por mim, num instante, vi que não mais estava comigo… já havia partido, penetrado o espaço distante…
O anjo permanecia em silêncio… como se não acreditasse na realidade daquele momento. Seu coração parecia auferir nova vivacidade. Apreensivo e atento continuava a ouvir…
− Ao deparar-me com teu terno ato muito lisonjeada fiquei… perdi-me em mim mesma, buscando o certo a fazer. Tu és um anjo e eu… apenas um ser humano. Como aceitar majestosa dádiva sem um pouco sequer merecê-la? Tua flor me cativou… em teu peito, porém, queria que La permanecesse… para que não morresse. Assim a jovem dizia, com seus amendoados olhos marejados.
Emocionados, ambos, enlaçaram-se envoltos daquilo que acreditamos ser os braços do amor… e nessa permuta subliminar era possível perceber o devir da Criação… a jovem buscava no anjo a divina proteção enquanto o anjo, em epifânico lampejo, percebeu seu real desejo… não mais seria aquilo a que outrora se enganara.. E ponderou consigo mesmo:
− Meu amor para ti existe… para servir-te! Não te rogarei jamais outra coisa, senão a própria permissão para amar-te e proteger-te. Atravessarei a eternidade a zelar por ti… não te cobrarei amor recíproco, pois um anjo verdadeiro hoje sou… cultivarei minha flor para que sintas seu perfume por onde fores. Este perfume te arrebatará quando em momentos tristes… lembrar-te-á que existe uma fonte de luz e que um anjo zela pela tua vida e que estará eternamente atrelado ao teu destino….
e o final dessa história não se pontua, não se finda, porquê o amor irradia pela eternidade…
E assim foi, o anjo e a jovem moça, em plenitude viveram o que em verdade é o amor.
Hênio Aragão